Eu
tenho um apelido. Já falei sobre isso quando descrevi as emoções e problemas
que tive com meu nome na infância, muitos deles relacionados ou derivados deste
mesmo apelido.
Na
família e entre os amigos de infância sou o Néco, e este apelido vai ficando, se
mantendo e renovando com as novas gerações. Sou o tio Néco, dindo Néco e assim
vai indo. Em breve, ou nem tanto, serei o “Vô Néco”.
Eu
gosto. Parece que aproxima mais, dá mais intimidade, casualidade nas relações.
Assim como prefiro ser tratado por “tu” a “Senhor”. Por mais que a relação seja
profissional ou tradicional sempre me parece estranho ser chamado de “Senhor”. Ser
chamado de “Você” me causa mais estranheza ainda, pior quando vem de alguém
aqui do sul onde usualmente nos tratamos na segunda pessoa.
Na
rua onde morei na infância/adolescência tínhamos uma turma muito boa, vários
piás mais ou menos da mesma idade, com guris e gurias interagindo. Uma rua
padrão Turma da Mônica, com as crianças brincando e jogando na rua, tempo em
que os maiores crimes, quebrar vidraças e flores das vizinhas com bolas
perdidas do jogo de taco ou futebol, eram punidos com penas severas, variando
de chineladas e castigo até sermões intermináveis.
O
estranho é que neste ambiente onde vivi a transição para a vida adulta, só eu
tinha apelido os outros todos eram tratados pelo nome, mas conheci alguns anos
mais tarde um pessoal de outro local onde absolutamente todos eram tratados por
apelidos, os mais estranhos, dentre estes o que mais me chamou à atenção foi o
Cabeça.
O Cabeça era um cara meio estranho, não
só pela sua cabeçorra, que lhe valeu o apelido, mas também pelo seu jeito
esquisito. Talvez fosse assim esquisito por causa da cabeça, pois ela
justificava o apelido. Talvez fosse por causa do apelido, que ressaltava as
proporções de sua cabeça, que por sinal, não era só grande, ela era feia. Muito
feia.
Mas na real o Cabeça não se importava
muito com isso, ou pelo menos era o que parecia. Ele usava aquele cabeção
raspado, reluzente. Uma mente brilhante.
Desfilava com aquela cabeça em cima do
pescoço. Parecia uma moranga campeã de feira agrícola. Parecia ter orgulho.
A gurizada da rua gozava da cara dele, e
ele não dava a menor bola. Não tinha vergonha. Andava com os outros e vivia
como se fosse normal alguém ter uma cabeça daquelas.
Lembrei disso porque esses dias vi um
piazinho chorando, reclamando que os outros guris estavam chamando ele por um
nome feio.
Deu pena dele, mas ao mesmo tempo
pensei que isso pode ser bom para a sua formação. Frustrações, decepções,
contrariedades, podem ser benéficas quando se sabe lidar. Se tiver apoio e
orientação, futuramente terá força e saberá assimilar melhor os tropeços e
rasteiras que a vida há de lhe pregar.
Portanto, um salve aos apelidos, ao bullying e aos “amigos” da infância e de
todas as épocas que nos dão experiência e nos servem de instrumentos para
crescer.
Aquele abraço!