sexta-feira, 31 de julho de 2009

Quem quer pão?







Lá pelas 3 da tarde aproximadamente, em meio a alguma brincadeira ou programa na TV ouço a voz da minha mãe. Entre uma tesourada e outra nos cabelos ou alguma pincelada de esmalte nas unhas de suas clientes do salão de beleza caseiro ela ordena:

- Neco, vai la no Renato. Compra meio quilo de semolina bem clarinho!

Lá vou eu entre indignado pela interrupção das minhas atividades e ansioso pelo pão quentinho. Naquele momento o almoço já se transformara em lembrança e começava a sobrar espaço no estômago.

Sentado no muro em frente ao armazém do Seu Renato, perscruto com olhos de um falcão o horizonte da avenida movimentada em busca daquela imagem tão conhecida da Rural Willys verde-branca do padeiro. Aquele vazio que num primeiro momento era apenas uma sugestão transformava-se aos poucos em uma cratera abdominal potencializando a ansiedade, turvando meus sentidos, deturpando a noção de tempo, transformando aquela curta espera em agonia, fazendo-me alvejar o pobre padeiro com terríveis, silenciosos impropérios.

Eis que finalmente desponta no horizonte o tão esperado transportador dos meus desejos. A ansiedade aumenta enquanto ele estaciona a caminhonete. Ao abrir a tampa traseira do veículo o cheiro do pão quentinho que exala perfuma a rua e o mundo. Observo atentamente os movimentos do entregador a retirar de lá um balaio quase do meu tamanho abarrotado com pães que despontam e me provocam. Eles não sabem o que os espera...

Volto para casa faceiro com aquela maravilha nas mãos, resistindo à tentação de torturá-lo; ao impulso de arrancar-lhe com requintes de sadismo pequenos pedaços e mastigar lentamente, saboreando sua derrota. Ao contrário, ele não é como um inimigo derrotado que devorado em um ritual passaria sua força e coragem a mim vencedor. Está ali, complacente, servil e pronto a cumprir sua sina de me alimentar.

Agora ele jaz na mesa, sobre uma tábua-de-pão ao lado da faca-de-pão. Aguardamos o leite que fumega na leiteira finalmente ferver para que possamos destroçá-lo.

Éramos 4 nestes rituais diários. Eu, minha mãe e meus dois irmãos. Minha mãe, sempre fazendo dieta ficava com as duas pontas do pão cortadas em pedaços minúsculos e o restante era dividido em porções iguais para os 3 animais que babavam e grunhiam ao redor da mesa.

Em alguns segundos aquele pão era partido, preparado e devorado por nós, sem a menor cerimônia ou constrangimento, mas com muito respeito, hoje eu sei.

Nestas tardes da nossa infância, quando só tínhamos sonhos, formavam-se juntamente com nossa moral e caráter o paladar e as preferências.

Somos adoradores de pão.

Talvez por sermos filhos de confeiteiro, com essa vivência de massas e coisas de padaria temos, eu e meus irmãos, uma loucura por pão. Qualquer tipo, mas preferencialmente aquele pão-d’água fresquinho, macio e crocante, branquinho, assado no ponto certo... hmmmm

Se me dão licença vou ali na padaria e já volto...







Aquele abraço...






Um comentário:

Anônimo disse...

Adorei neco e acho que isso passou para os netos... essa família é gulosa mesmo... fê.

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